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domingo, 6 de novembro de 2011

Artigo: Economia global - o temor de uma queda

Enquanto o mundo acompanha apreensivo a crise na Europa e nos Estados Unidos, a China é a protagonista do novo capítulo da economia global.
Estamos enfrentando renovados riscos de instabilidade e de redução do ritmo da economia, antes de se chegar a uma completa recuperação da chamada Grande Recessão. As possibilidades de evitar tais consequências estão ficando escassas, por causa das fragilidades e desequilíbrios acumulados durante vários anos como resultado de políticas equivocadas dos Estados Unidos e da Europa que não podem ser canceladas facilmente.

O forte crescimento nas economias em desenvolvimento e emergentes desde meados de 2009 não é sustentável. Em primeiro lugar, é o resultado de uma enérgica política de resposta à crise, cujos efeitos estão decaindo em várias economias em desenvolvimento, particularmente na China, principal locomotora para os países exportadores de matérias-primas, enquanto as perspectivas de crescimento nas principais economias avançadas estão piorando. Além disso, a resposta à crise nas economias avançadas, mediante uma liquidez excessiva e acentuados cortes nas taxas de juros, está criando bolhas nos mercados de commodities e no mundo em desenvolvimento. Essa moeda barata em busca de rendimentos impulsiona o crescimento em várias economias emergentes, mas não é perdurável.

A China introduziu um programa de estímulos maciços que chega a 15% do PIB, que triplica nos Estados Unidos. Contudo, tais estímulos estão concentrados nos investimentos, que superam os 50%, enquanto o apoio à renda das famílias continua sendo moderado, apesar de o país enfrentar um problema de subconsumo. De fato, o consumo privado gira em torno dos 36% do PIB, a metade do nível dos Estados Unidos.

A China precisa reduzir sua dependência das exportações e ampliar o mercado doméstico para crescer. Seu superávit na balança de pagamentos caiu de um pico de 11% do PIB, em 2006, para 5%, no ano passado. As necessidades de ajuste da China devem se basear em uma rápida expansão dos salários, sem afetar os preços e o emprego. Desse modo, sua moeda poderia ser valorizada e a demanda doméstica deveria crescer para enfrentar a redução das exportações. Nessa direção, o país adotou recentemente medidas para aumentar os salários mínimos, gerar emprego, reforçar o setor de serviços, melhorar as redes de assistência social etc.

O que acontecerá caso a China diminua o ritmo de sua economia? Se a redução passar de índices de dígito duplo para 7%, poderá ter um sério impacto adverso para os exportadores de matéria-prima. Entretanto, no longo prazo, uma virada para o crescimento baseado no consumo interno poderia aumentar sua demanda de grãos e carne, agravando a carestia no mercado mundial de alimentos.

Como terminará tudo isto? Vejo quatro possíveis cenários.

1. Essas bolhas poderiam acabar em uma abrupta contração monetária nos Estados Unidos. Inclusive, pode ocorrer antes de uma recuperação da recessão como resultado de uma crescente inflação e/ou pressões sobre o mercado de bônus. As atuais taxas de juros próximas de zero não se manterão no longo prazo e a questão é se voltarão à normalidade gradualmente ou abruptamente.

2. Uma significativa desaceleração da economia chinesa, possivelmente agravada pelo estouro da bolha do crédito e da propriedade, pode por fim ao auge nos mercados de matéria-prima, além de desencadear um êxodo maciço dos capitais especulativos dos mercados de commodities.

3. Uma crise na balança de pagamentos de uma importante economia em desenvolvimento poderia acabar com o boom dos fluxos de capital por um efeito de contágio nos mercados emergentes. Por exemplo, a Turquia tem agora um déficit de conta corrente perto de 10% do PIB e em outras economias emergentes os déficits são elevados. Uma repentina mudança de humores nos mercados, como ocorreu no Leste da Ásia durante 1997, poderia desencadear uma crise monetária e de pagamentos naqueles países.

4. O calcanhar de aquiles das finanças globais está agora na Europa, onde a insolvência é uma possibilidade concreta em sua altamente endividada periferia. Enquanto as autoridades europeias continuarem pretendendo que se trate principalmente de uma crise de liquidez, a região continuará exposta a uma extrema instabilidade e turbulentas crises, que afetarão os fluxos de capital e a estabilidade financeira nas economias emergentes.

Em qualquer desses cenários, é provável que uma redução dos fluxos de capital venha associada a uma inversão nos preços das matérias-primas. Isso implica que os países mais vulneráveis serão aqueles que estão gozando dos duplos benefícios da expansão da liquidez global: a afluência de capitais e o auge das matérias-primas.

A economia mundial está em uma situação frágil, com crescentes déficits orçamentários e dívidas soberanas nas economias avançadas, bolhas de bens e crédito, oscilações das taxas de câmbio e cada vez maiores déficits de conta corrente em várias importantes economias emergentes. Cada vez mais se reconhece ser improvável uma transição suave e sem complicações da economia mundial para um crescimento estável, sustentado e sobre bases amplas. Daí as repetidas vozes sobre uma próxima crise.

Ylmaz Akyuz é o economista-chefe do South Centre, uma organização intergovernamental de países em desenvolvimento, com sede em Genebra.

Fonte: Envolverde/IPS

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